DEFESA NACIONAL e Forças Armadas

O descaramento anda a par<br> com as más políticas

Rui Fernandes

É grande a sucessão de notícias sobre aspectos ligados com as Forças Armadas. Nalguns casos, são meras «lebres» para ver o que dá, noutros abordagens com doses aumentadas de maldade para depois, afinal, a «coisa» concreta acabar por não ser assim tão má. Numa ou noutra versão, tudo concorrendo para passar a imagem de que o Ministério de Defesa Nacional/Governo está a fazer, a mexer, e a mexer e a fazer mal.

O caso paradigmático das mexidas na saúde militar com a fusão dos hospitais é a prova disso. Mas também o é o caso da extinção do fundo de pensões que tem como curiosidade ter sido um governo PSD/Cavaco a lançá-lo e a promovê-lo e ser um governo PSD a querer unilateralmente a extingui-lo.

Agora prepara-se o Governo para apresentar uma nova Lei Orgânica de Bases das Forças Armadas (LOBOFA) e uma nova Lei de Defesa Nacional e Forças Armadas (LDNFA). Prepara-se para as apresentar depois de, segundo as notícias, terem sido aprovadas, no passado dia 24 de Março, em reunião do Conselho Superior de Defesa. Tudo estaria a correr o seu curso normal não fosse dar-se o caso de, antes desta aprovação, ter sido publicamente dito que os grupos parlamentares já tinham os respectivos projectos, coisa que não aconteceu com o Grupo Parlamentar do PCP, mas aconteceu com o do PS. E daqui se extrai e conclui o seguinte:

Primeiro, é que não tem sentido distribuir aos grupos parlamentares propostas que ainda não tenham percorrido o seu normal circuito;

Segundo, é que isso até pode ser feito se o objectivo for recolher contributos para a construção dos respectivos projectos, sendo que isso em nada colide com a posterior discussão dos projectos concretos no quadro do seu desenvolvimento processual. Mas a ser assim, deverá ser distribuído a todos e não só a alguns como foi o caso;

Terceiro, é que, pelos vistos, o Governo quis esses contributos do PS, mas não os quis dos restantes grupos parlamentares da oposição, nomeadamente do PCP;

Quarto, é que mais uma vez foi dado uso ao pacto entre PS, PSD e CDS.

É neste contexto que surge Perestrelo do PS a dizer que «o Governo não procurou o consenso, tendo-se limitado a dar ao PS as propostas há duas semanas», ou seja, duas semanas antes da aprovação acima referida em reunião do Conselho Superior de Defesa. O mínimo que se pode dizer é que falta de descaramento o PS não tem.

Nestas mesmas declarações Perestrelo diz que «considera incompreensível que o Governo queira alterar as referidas leis, quando o enquadramento legal existente, resultante de um consenso alargado com todos os partidos, ainda não foi completamente implementado».

Estamos outra vez no domínio do descaramento, porque o consenso alargado que Perestrelo refere é o do Governo PS/Sócrates (em que Perestrelo era secretário de Estado de Augusto Santos Silva) com o PSD e o CDS, ou seja, o consenso do costume, o consenso dos últimos 37 anos, o consenso em que PS e PSD alternando-se conduziram o País à situação em que se encontra e a Instituição Militar a uma crescente governamentalização e bloqueio, mas também de despesismo a partir de opções de reequipamento que, como ao longo dos anos o PCP tem alertado, não tiveram em conta as possibilidades e as prioridades nacionais e que, como se tudo o resto não bastasse, as envolveu num manto de negócios cuja culpa parece morrer solteira.

Mas estas afirmações de Perestrelo surgem depois de uma entrevista do seu camarada de partido Miranda Calha, onde este diz em síntese duas coisas: o Governo não tem feito nada na área da Defesa e, sobre o País, o PS terá inevitavelmente de entender-se com o PSD.

Sobre a primeira afirmação, de tão estapafúrdia, nem se faz grande comentário. Bastaria a Miranda Calha ouvir o que diz o CEMA sobre o que necessita para a manutenção dos navios e aquilo que tem e, provavelmente, não diria o que disse. Sobre a segunda, dir-se-á que essa inevitabilidade, umas vezes na sombra outras vezes às claras, não é do domínio do futuro, mas do presente.

Citando Samuel Butler «a consciência é muito bem-educada. Deixa logo de falar com aqueles que não querem escutar o que ela tem a dizer».




Mais artigos de: Argumentos

Grândola

Há 40 anos foi o cabo dos trabalhos. Era então um espectáculo com gente proibida, quer-se dizer: um concerto amputado antes de nascer, estarão lá as pessoas, as vozes das pessoas com microfones abertos para as receber. Porém, que palavras entoariam essas vozes, que versos...

Ei-los que chegam

O programa começara por abordar a ameaça representada pela subida da extrema-direita em diversos pontos da Europa, com o caso francês referido em primeiro plano na sequência dos resultados obtidos pela FN nas eleições autárquicas. De passagem, convirá registar que o...